10 de março de 2021

Bolachas húngaras e as mudanças.

And now I tell you openly: you have my heart, so don't hurt me.
You're what I couldn't find, a totally amazing mind, so understanding and so kind.
You're everything to me.
Oh, my life is changing everyday, in every possible way.
And oh, my dreams, it's never quite as it seems, 'cause you're a dream to me.

The Cranberries

Eu e o Pedro tínhamos a vida desenhada. Íamos casar, ter um filho, acabar o internato, mudarmo-nos para longe, comprar uma casa, ter outro filho, ter outro filho, talvez ter outro filho, talvez ter outro filho. Viver longe de Lisboa, numa casa nova com quintal, com os nossos 'não menos de três, não mais de cinco' filhos. 

Não sei quem mudou de ideias primeiro. 

Adiantar a chegada da Gabriela foi uma decisão mútua. Inicialmente queríamos terminar o internato o mais depressa possível e mandarmo-nos daqui para fora, mas depois da vinda do Matias ficámos loucamente apaixonados por sermos pais e quisemos mais e mais depressa. Vai daí, a decisão 'ter outro filho' adiantou-se à 'acabar o internato', que se tudo correr bem é o próximo item da lista (no próximo ano). Mas o que nos acontece depois ainda é uma incógnita. 

Porque agora eu não quero sair de Lisboa e o Pedro não quer ter mais filhos. 

Não sei quem mudou de ideias primeiro. 

Talvez eu tenha ficado tão habituada a viver cá que não me apetece ambientar-me a um sítio novo, conhecer novos donos do café, ouvir as histórias da nova senhora da florista e assistir às gravidezes da senhora do novo restaurante japonês. Lisboa como cidade grande e cultural não me atrai porque venho de um sítio pequeno onde sempre fui estimulada: é desta Lisboa como sítio pequeno e das nossas vivências bairristas que eu sei que vou sentir imensa falta. 

Talvez o Pedro tenha sentido que a chegada da Gabriela nos completou, nos deixou num equilíbrio perfeito do dois-para-dois ou então num limite tremido de loucura que a chegada de mais um membro vai fazer tombar para a insanidade total. 

Mudámos. 

Nunca nos foi difícil ceder e negociar, mas aqui não há meio termo. Eu quero mais ter um terceiro filho do que ficar em Lisboa e estaria disponível para ceder, mas o Pedro está decidido a não ter mais filhos, e por isso sou-vos sincera: a minha vontade de ceder e sair de Lisboa começa a diminuir consideravelmente, numa espécie de 'lixa-te Pedro' que não reconheço. 

(Quer dizer. Até reconheço, vá.)

Entram aqui outras variáveis na equação. É altamente improvável que consiga ter vaga no concurso em Lisboa (não eu especificamente, mas a esmagadora maioria dos colegas que têm saído nos últimos anos, e eu não serei diferente), e mesmo que consiga não será fácil ter cá o nível de vida que teríamos numa cidade mais pequena (eufemismo para adeus casa nova com quintal a não ser que caia um milhão de herança). 

E sabem? Angustia-me esta ausência de planos, estes riscos estranhos em cima do meu desenho tão perfeitinho, a aura definitiva que arrastam as decisões importantes que temos pela frente. Não quero engravidar depois dos 35 anos, até pela minha questão cardíaca, e já tenho 32. Se o Pedro não mudar de ideias nunca mais vou estar grávida, e logo eu, que detesto estar grávida, sinto que não me preparei para isso, que falta qualquer coisa, que cheguei à parte mais esperada da refeição só para ouvir o senhor dizer 'acabou a mousse de chocolate'. Percebo (e concordo com) os argumentos do Pedro, mas eu ainda não cheguei à sobremesa. Quero mais. 

Mudámos, como mudam as pessoas que começam a namorar aos 18 anos e vão avançando a crescer pela vida. Mudámos juntos, mas temos planos incompatíveis. Ainda nos faltam pela frente uns bons meses de reflexões e de conversas, de lutos e de adaptações. E nós metemo-nos ao caminho e vamos caminhando. Chegamos sempre onde nos esperam, afinal. 

E como já não sou a Joana de 2013, também me fez sentido voltar a publicar aquela que é a publicação mais visitada de sempre do blog: a das bolachas húngaras. Passei de fazer as bolachas preferidas do Pedro para passar a fazer as bolachas preferidas do Pedro E do Matias. Se calhar não mudei assim tanto. 

Bolachas húngaras

Ingredientes (para cerca de 60 bolachas pequenas):

* Seis gemas de ovo;
* 250g de farinha sem fermento;
* 45g de amido de milho (farinha maizena);
* 150g de açúcar em pó;
* 170g de manteiga à temperatura ambiente;
* Uma colher de chá de essência de baunilha;
* 200g de chocolate.

Confecção: 

* Aquecer ligeiramente as gemas de ovo numa panela até engrossarem;

* Misturar a farinha de trigo, a farinha maizena, o açúcar em pó, a manteiga, a essência de baunilha e as gemas cozidas e amassar bem até formar uma bola; 

* Envolver em papel aderente e levar ao congelador durante vinte minutos;

* Estender a massa numa superfície enfarinhada e cortar bolachas com meio centímetro de espessura;

* Colocar num tabuleiro coberto com papel vegetal e levar ao forno pré-aquecido a 170º durante quinze minutos;

* Retirar do forno, deixar arrefecer um pouco e quando as bolachas estiverem firmes transferi-las para uma rede para arrefecerem totalmente;

* Derreter o chocolate no micro-ondas ou em banho-maria e mergulhar as bolachas (em alternativa podem pincelá-las, mas eu achei mais prático mergulhá-las).

* Reservar até o chocolate solidificar.