A viagem aos Açores, embora absolutamente extraordinária, foi tremendamente cansativa. Dormia pouquíssimo (o Matias acordava de duas em duas horas para comer, possivelmente num dos seus picos de crescimento), ainda estava a gerir toda a novidade de viajar 'sozinha' com um bebé de quatro meses e andámos sempre de um lado para o outro a conhecer coisas. Quando cheguei estava esgotada. Fisicamente esgotada. Mentalmente esgotada. Emocionalmente esgotada.
No fim-de-semana recuperámos ambos as energias e voltámos às rotinas. O Pedro entrou em acção, eu descansei bastante e o Matias voltou a dormir bem (com direito a soninhos de doze horas seguidas). Tudo ficou melhor. Eu sentia-me melhor. Cansada ainda, muito cansada. Mas melhor.
Na Terça-feira o Matias foi fazer as vacinas, o que cá em casa equivale a uma semana de 'não-quero-comer-não-quero-dormir-odeio-a-minha-vida'. Nunca percebemos porquê: o miúdo não faz febre, não fica com dores, simplesmente fica rabugento. Uma semana depois, volta ao normal.
Na Quarta-feira tive um problema com o carro e tive de ir à oficina duas vezes. À noite tive aula de canto. Cheguei a casa já depois do Matias estar na caminha. Cansada. Cada vez mais cansada.
Ontem acordei com uma reacção alérgica grave a uma picada de mosquito num olho (na verdade foram cinco mosquitos, coisa que sei porque os matei e todos tinham sangue). Estamos com uma qualquer praga de mosquitos em casa desde então. Estou a fazer corticóide.
À noite o Pedro teve futebol. Dei o banhinho ao Matias e deitei-o, mas pela primeira vez em muito, muito tempo ele não queria dormir. Demorei uma hora a conseguir adormecê-lo.
Hoje foi um dia muito, muito difícil. O Matias estava rabugento, eu também. O Matias não queria comer. O Matias não queria dormir. O Matias chorou uma hora depois do banho e do leitinho. O Pedro esteve doze horas de banco e depois foi ver o jogo do Sporting.
E eu estou esgotada. Fisicamente esgotada. Mentalmente esgotada. Emocionalmente esgotada.
A dada altura levantei a voz e implorei-lhe que se calasse, coisa que só o fez chorar ainda mais alto. E foi então que explodiu. A culpa. Aquela culpa horrível.
É impossível explicar a quem não é mãe o sentimento de culpa que nos destrói o coração quando perdemos o controlo e gritamos a um filho, que está certamente tão desesperado como nós (com a grande desvantagem de não conseguir expressá-lo de outra forma sem ser chorando). Sentimo-nos uma merda. Sentimo-nos as piores mães do mundo. Sentimo-nos más.
Hoje, pela primeira vez desde que o Matias nasceu, eu chorei agarrada a ele. Chorámos os dois, sentados na cadeira onde o embalo, no escurinho do quarto. Embalei-nos até ele adormecer e eu acalmar. E ele sossegou.
Mas a culpa continua cá. Aquela culpa horrível.
Amanhã ele vai acordar e vai sorrir para mim. Vai fazer aquele sorriso enorme, agitar os bracinhos e as perninhas e rir à gargalhada quando lhe mordiscar os pés. E eu vou pedir-lhe desculpa. Vou explicar-lhe que às vezes a mamã também fica rabugenta.
Sei que a culpa horrível vai embora. Sei que faz parte de toda esta viagem. Sei que o meu filho me acha a melhor mãe do mundo, até porque não tem outra e só conhece esta realidade. Mas também sei que hoje falhei. Hoje foi um dia mau.
Hoje estou esgotada. Fisicamente esgotada. Mentalmente esgotada. Emocionalmente esgotada.
(Posto isto, vou fazer um gin.)
(Desculpem lá a deprimência, mas isto também faz parte da maternidade.)