25 de março de 2017

Nunca fomos tão bons pais (o estudo da Dodot).

Há uns seis meses assisti a uma conferência de um psiquiatra muito conceituado. A dada altura, o senhor dizia que os pais de hoje em dia eram péssimos, que eram adultos imaturos e auto-centrados, que os miúdos cresciam com a cara nos tablets, que os pais não vinculavam com os filhos, etc etc etc (o discurso do costume). Saímos para o intervalo e uma das minhas colegas disse algo do género 'realmente, este fulano tem razão'. E eu disse-lhe que talvez até concordasse com ele antes de ser mãe, mas agora decididamente não concordo.

De facto, acho que nunca estivemos tão atentos aos nossos filhos como hoje. Nunca estivemos tão envolvidos, tão preocupados e tão vinculados. Andamos com eles em mochilas para que fiquem próximos de nós. Andamos com eles virados para nós nos carrinhos para que vinculem connosco. Ficamos pelo menos quatro meses em casa com eles (e quem acha que antigamente as mães passavam muito tempo com os filhos certamente nunca ouviu a minha avó a relatar a infância dela, com mais oito irmãos e ambos os pais a trabalhar). Ouvimos as opiniões deles. Respeitamos a individualidade deles. Brincamos com eles. Procuramos actividades adequadas a eles. Nunca estivemos tão informados sobre o desenvolvimento, a estimulação correcta e a segurança. Nunca fomos tão bons pais.

O que não quer dizer que sejamos perfeitos.



Há um mês fiz uma formação sobre a importância do brincar. Havia duas médicas (eu inclusive), umas quantas enfermeiras e um montão de professores. A dada altura, um dos participantes dizia que os pais de hoje em dia eram péssimos, que não deixavam as crianças brincarem livremente, que os miúdos cresciam com a cara nos tablets, que os pais não vinculavam com os filhos, etc etc etc (o discurso do costume). E eu levantei o braço e disse que decididamente não concordo. E falei exactamente das mesmas coisas. E disse que ali estávamos nós, um monte de adultos, a fazer uma formação sobre a importância do brincar para o desenvolvimento dos miúdos.

Ontem a directora de turma de um dos miúdos da minha consulta telefonou-me às 19h. Passámos quase uma hora ao telefone a conversar enquanto eu brincava com o Matias e preparava o banho dele. A dada altura, a professora comentou que os pais de hoje em dia etc etc etc. E eu disse-lhe que há trinta anos atrás o mesmo menino sobre quem estávamos a falar já nem sequer estaria na escola. Possivelmente estaria a levar porrada dos professores e dos pais porque se porta mal. E decididamente não teria tantos adultos à volta dele (assim de repente conto os pais, os professores, eu e o médico de medicina tradicional chinesa) a tentar ajudar.

Eu sou uma pessoa optimista, e creio que esse optimismo se nota na forma como vejo a parentalidade. E não suporto que se fale dos pais de hoje em dia desta forma tão depreciativa, como se há cinquenta anos tudo fosse lindo e agora fôssemos todos uns inúteis.

Apesar disso, confesso que fiquei triste quando li o estudo da Dodot onde 49% dos pais afirmava mudar a fralda do seu bebé diariamente. Em dez pais, apenas cinco mudam uma fralda todos os dias. É claro que há cinquenta anos este número seria muitíssimo mais inferior... Mas mesmo assim, e observando os casais que conheço, confesso que esperava um bocadinho mais.

Curiosamente, e segundo o mesmo estudo, 88% dos pais realiza tarefas de cuidado do bebé diariamente, por isso talvez o problema seja especificamente com as fraldas. Cá em casa também há tarefas que tendencialmente é um de nós a fazer: assim de repente ocorre-me o facto de eu nunca ter cortado as unhas ao meu filho porque o Pedro é que está habituado a operar coisas pequeninas.

(Uma vez até o levei ao cabeleireiro para a esteticista lhe cortar as unhas!).

Neste estudo feito pela Dodot concluiu-se que 87% dos pais costuma brincar com os seus filhos, 49% muda as fraldas, 55% dá as refeições e 51% vai deitá-los ou adormecê-los. Cá em casa o Pedro brinca imenso com o Matias, mudamos frequentemente as fraldas juntos (ou então à vez), damos o jantar juntos (ou então à vez), damos banho juntos e geralmente o Pedro dá o biberão ao Matias e deita-o. No dia seguinte eu levanto-o, dou-lhe o biberão, visto-o e levo-o para a escola. O Pedro vai buscá-lo, brinca com ele, deita-o para dormir a segunda sesta da tarde, entretanto eu chego e repete-se tudo novamente. Quando estamos sozinhos com o miúdo safamo-nos super bem porque estamos igualmente habituados a fazer as coisas.

(Vá, à excepção de cortar as unhas no meu caso. E o Pedro insiste que não sabe fazer as papas do Matias, embora seja super fácil).

No fim do estudo, metade dos pais afirma que gostaria de passar mais tempo com os filhos. Num mundo onde cada vez mais os nossos filhos são prioritários para nós, mesmo assim não nos chega. Queremos mais. E isto é incrivelmente positivo.

Por isso atrevam-se a dizer que os pais de hoje em dia são péssimos. Digam que não queremos saber, que chutamos os miúdos para as escolas e para as actividades, que os entupimos em tecnologia, que não os sabemos disciplinar e que antigamente é que era. E depois olhem à vossa volta. Olhem para o que já se construiu. Vejam o quanto já se avançou.

E naqueles dias em que se sentirem uma merda (os meus são geralmente às Terças, porque estou de urgência e chego às 19h e passo pouco tempo com o meu patuscão) respirem fundo, abracem os vossos filhos e pensem:

Nunca fomos tão bons pais.

(Conheci este estudo da Dodot porque eles me enviaram umas fraldas novas para experimentar. Cá em casa somos fãs das Dodot Activity, por isso vamos comparar com estas e depois digo o que achámos) :)