22 de novembro de 2015

Pregnancy Diary #8

Não sendo propriamente um tópico típico de um diário de gravidez, hoje gostava de vos falar de algo que me tem aborrecido um bocadinho ultimamente.

Sempre tive amigos com pais médicos. Nunca os achei diferentes por causa disso e os meus pais não me educaram no sentido de tratar os outros de forma especial (sendo ela melhor ou pior) por causa da profissão dos pais. No entanto, era inegável que em alguns contextos esses meus amigos tinham efectivamente um tratamento diferente - nomeadamente, pelos professores ou auxiliares das escolas por onde passei. Nunca liguei muito ao assunto.

Desde que engravidei, apareceram os comentários. Primeiro no centro de saúde e depois no local onde fiz a ecografia do primeiro trimestre, o facto de sermos os dois médicos pareceu saltar à vista no meu boletim de saúde da grávida e deu azo a afirmações como 'muito bem, os dois médicos!'. 

Por fim, aconteceu nas creches. Quando as pessoas perguntavam o que fazíamos (porque isso parece ser importante por uma qualquer razão que eu desconheço) e nós respondíamos que somos médicos quase conseguíamos ouvir as pinguinhas de xixi a cair com o entusiasmo.

E foi então que percebi que o nosso filho vai ser 'o dos paizinhos médicos'.




Quem nos conhece na nossa vida pessoal sabe que nós somos talvez a antítese de aquilo que as pessoas normalmente associam aos 'paizinhos médicos' (correspondendo isso à verdade, ou não).

Eu não tenho malas da Michael Kors e da Bimba Y Lola e tenho orgulho na minha (mini) colecção de All Stars. O Pedro recusa-se a comprar um smartphone e ainda usa um daqueles Nokia velhinhos. Não temos televisão em casa. Não conduzimos Porsches. Se nos assaltassem, a única coisa valiosa para roubar cá de casa seria a minha máquina fotográfica.

Não somos ricos, não somos snobs e não vamos tratar os nossos filhos por você (não que ache que há algum problema com isso, tenho imensos amigos que tratam os pais por você e não são de todo snobs). Não temos dois apelidos nem títulos de família.

Somos pessoas absolutamente normais, que por acaso são médicas. E recuso-me a deixar que o que faço em oito horas do meu dia defina a pessoa que sou para os outros nas restantes dezasseis.


E foi por isso que algumas das creches saíram da lista. Não porque não gostámos delas, não porque o espaço não nos tivesse agradado ou porque as crianças estavam mal tratadas, mas sim porque nos sentimos tratados de forma diferente. E eu recuso-me a compactuar com o sistema que ensinaria ao meu filho que as pessoas têm valores diferentes por causa do que fazem.

Porque, em última análise, as crianças não têm preconceitos: são-lhos ensinados. E, no que depender de mim, o meu filho vai ser tão liberal como nós.